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segunda-feira, 1 de julho de 2019

Padres sem batina

A Igreja Católica se ressente da falta de missionários dedicados a pregar a palavra de Deus em regiões remotas e cogita liberar na Amazônia a ordenação de homens casados e de comprovada fé

Não é de hoje que a Igreja Católica perde espaço para outras religiões por falta de padres que levem a palavra de Deus até os lugares mais longínquos. Há uma espécie de carência de trabalho árduo propagando a fé. Para tentar sanar esse problema, um documento preparatório para o Sínodo da Amazônia, assembléia de bispos, que será realizada em outubro em Roma, recomenda que se permita na região a ordenação de laicos casados, sobretudo de indígenas que comprovem a sua fé. 

São os chamados “viri probati”, homens não celibatários que podem exercer atividades eclesiais e celebrar a eucaristia. A decisão final sobre esse tipo de ordenação ainda não tem prazo para ser tomada, mas conta com a simpatia de bispos progressistas e moderados. Embora o documento ressalte que “o celibato é um presente para a Igreja”, há a recomendação de que “nas zonas mais remotas da região se estude a possibilidade de ordenação sacerdotal de idosos respeitados e aceitos por sua comunidade, ainda que já tenham uma família constituída e estável”. Considera-se também a hipótese de que mulheres missionárias tenham permissão para fazer a catequese.
Dom Roque Paloschi, arcebispo de Porto Velho e presidente do CIMI (Crédito:Divulgação)
“Essa questão da ordenação de padres casados é um horizonte, não uma decisão, mas um debate que está se iniciando”, afirma dom Roque Paloschi, arcebispo de Porto Velho e presidente do Conselho Indigenista Missionário (CIMI). “Ninguém é contra o celibato, mas não podemos ignorar nossas dificuldades locais”. 

A diocese de Porto Velho é um bom exemplo da escassez de sacerdotes na região amazônica. Ela reúne cerca de 950 mil habitantes, se expande por uma área de 87 mil quilômetros quadrados e conta com apenas 42 padres. A diocese abrange 26 paróquias e quatro áreas missionárias que não estão sendo devidamente atendidas. “Nós temos uma situação de poucos sacerdotes para a região e precisamos superar a tendência de uma igreja que seja apenas de visitação, que passem pelos lugares, para uma igreja presente, encarnada, que permanece”, diz dom Roque Paloschi. Uma das maiores circunscrições eclesiásticas do País, o Xingu, com 365 mil quilômetros quadrados, conta com somente 27 padres. 

Concílio de latrão 
A Igreja da Amazônia enfrenta um dilema grave. Os poucos sacerdotes que ali atuam tem dificuldade para circular pela região, onde as comunidades estão separadas por longas distâncias. Precisam de barcos, carros, animais para fazer seu trabalho. Há comunidades que passam meses sem receber padres para celebrar missas e ouvir confissões. O que se defende é que haja um novo tipo de sacerdote ao lado do tradicional que possa dar atenção ao seu rebanho. Uma das conseqüências dessa baixa presença de católicos é o aumento do número de seguidores de religiões evangélicas. No começo do século, 19,8% da população amazônica era evangélica seguiam tal credo e o percentual subiu para 28,5% em 2010. Das 340 etnias indígenas presentes na região, 182 contam hoje com missionários evangélicos e representantes da população local. 


Na prática, o encontro de bispos irá alimentar a velha discussão sobre o fim do celibato. A decisão em relação à Amazônia pode abrir a possibilidade de ordenação de homens casados em outras partes do mundo. Não é a primeira vez que isso acontecerá. Em 2009, o papa Bento XVI autorizou a ordenação de sacerdotes anglicanos conservadores que abandonaram a Igreja Inglesa e decidiram se converter ao catolicismo. Na ocasião, foi permitida a conversão sem que houvesse a obrigação de se adotar o celibato. Em 2017, o papa Francisco já havia considerado a possibilidade de ordenar homens casados em regiões remotas para suprir a falta de missionários. A sugestão de ordenar “viri probati” teria vindo do cardeal emérito de São Paulo dom Cláudio Hummes, que será o relator geral do Sínodo da Amazônia. 

O celibato foi imposto pela igreja no século 12. No primeiro e no segundo Concílio de Trento, realizados, respectivamente, em 1123 e 1139, foram condenados e tornados inválidos tanto o concubinato quanto o casamento de clérigos. O celibato era defendido para que os padres pudessem se dedicar totalmente à Igreja, sem qualquer entrave familiar e ficassem mais livres e disponíveis para propagarem sua fé. Outra razão do impedimento de casamento de padres era evitar problemas de herança e garantir preservação e o aumento do patrimônio da Igreja. Em 1563, o Concílio de Latrão impôs o celibato para o clero da América Latina. Agora, poderão ser abertas exceções. O celibato não é um dogma e, portanto, trata-se de uma prática que pode ser alterada.

Escrito por Vicente Vilardaga
https://istoe.com.br/padres-sem-batina/

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