A Guerra de Cacimbinhas - 16 de setembro, Cacimbinhas, A noite inesquecível - DiCacimbinhas

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segunda-feira, 5 de outubro de 2020

A Guerra de Cacimbinhas - 16 de setembro, Cacimbinhas, A noite inesquecível


Neco cumpre o que promete a Juca e o prepara para a estreia esperada. Ele ingressa na casa de Nair como velho conhecido que é, instala-se numa mesa a um canto próximo à janela para que possa respirar em meio a tanta fumaça de palheiro e sai aos cochichos com cada mulher que passa entre eles. 

Fica quinze minutos nessas conversações, acompanhado a distância pelo olhar do irmão, até retornar acompanhado, mãos dadas com Susana, a jovem que aceitou deitar-se com Juca em troca de alguns mil-réis. 

– Oh! Susana, não chores por mim – entoa Neco, numa grosseira imitação de famosa canção norte-americana – colocando-a entre ele e Juca.

– Qual é o teu nome? – pergunta ela para um espantado interlocutor. 
– José Antonio, e o seu? 
– O meu é Susana. Já deitastes com mulher? 
– Só em sonho, mas é tudo o que quero. 
– Mas és tão novinho. Não pareces ter mais que dez anos!
– Tenho quase 15, nasci junto com o século, em 1901. 

Ela faz contas com os dedos e depois o corrige: 
– Se foi em 1901, tens 14 e não 15. 
– Eu disse quase 15. 

Neco retira-se, o interesse voltado para o seu próprio prazer, despedindo-se de Juca e de Susana com um cúmplice piscar de olho. E o casal vai em direção oposta, ela pronta a seguir a sina que cumpre desde que se deu aos apelos de um rapaz vizinho e por isso foi rejeitada pela família e por ele mesmo. 

Mais tarde, os dois irmãos caminham pela madrugada escura da vila, em direção à residência urbana, num silêncio inicial que Neco não consegue manter: 

– E então?
– Então o quê? 
– Porra, tchê. 
Conta aí como é que foi!
– Foi com tinha que ser. 
– Foi bom? 
– Na hora foi muito bom. Mas depois dá uma ressaca. 
– Ressaca? Mas tu nem sabes beber! 
– Já tomei uns goles de canha com os peões no galpão do Arroio Grande e achei muito ruim, tive vontade de vomitar. 
– Mas é isso que estás sentindo depois da tua primeira trepada? Vontade de vomitar! 
– De vomitar não, mas não sei por que, não consigo parar de cuspir. 

– Isso é normal, também mijaste depois? 
– Sim. E ela também. Na bacia onde se lavou. 

O irmão mais velho espalha sua gargalhada pela madrugada cacimbinhense, orgulhoso de ter propiciado essa experiência ao mais moço. Dá-lhe um pontapé na bunda, retomando uma brincadeira infantil esquecida há mais de uma década, e corre, à frente, aguardando por Juca com a porta da casa de esquina já entreaberta pela atenta Valdelíria, a guardiã dos Farias na vila. 

– Vocês se acalmem que ainda é madrugada. Isso são horas de chegar? O que vou dizer aos pais de vocês quando eles vierem à vila? 
– Diga-lhes que Juca é um homem e que eu vou cuidar dele para sempre – responde Neco, só agora recebendo de volta o pontapé que havia desfechado no irmão minutos antes.   

SOBRE O AUTOR  
Luiz Antônio Nikão Duarte (Porto Alegre, 1953) é formado pela PUCRS (graduação/1977, especialização, 1982 e doutorado/2012), ESPM (MBA/2002) e UFRGS (mestrado/2007). 

Exerce o Jornalismo desde 1975, com passagens pelos grupos DiárioS e Emissoras Associados, Caldas Júnior, Jaime Câmara, RBS, O Estado de S. Paulo, Sistema Jornal do Brasil; pelos Governo Federal e do Rio Grande do Sul; e ainda pelo Congresso Nacional, pela Associação Nacional de Jornais, pela Federação das Indústrias (FIERGS) e pela PUCRS. 

Professor (UnB e Uniceub, na década de 1990 e da Unisinos, na atualidade). Participou da antologia Contos de Oficina 21 (Porto Alegre: Edipuc, 1998) e escreveu os livros Redação em RP (São Leopoldo: Unisinos, 2012) e A guerra de Cacimbinhas (Porto Alegre: ComEfeito, 2015).

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