Ney de Lima Costa assume a Intendência de Cacimbinhas como o seu sétimo titular desde o advento da República, o segundo nomeado pelo Governo do Estado. Não chega a ser uma grande cerimônia a sua posse, pela provisoriedade de sua indicação, acrescida da divisão que se aprofunda no Partido Republicano, entre os barbosistas e seus adversários, os primeiros indignados com a tomada de posição pelo emissário do presidente Borges de Medeiros - e os outros alinhados com ele na condução da política municipal.
De tudo o que tem observado nesses poucos dias desde que chegou a Cacimbinhas, pouco agrada ao agora intendente provisório.A administração está parada, o partido rachado, a desconfiança é generalizada entre as duas tendências e há ainda os federalistas. Minoritários, mas sempre prontos a atrair os republicanos descontentes e assim engrossar a oposição. A esses, Ney quer exercer fiscalização vigorosa, para limitar suas ações em nome da fidelidade que dedica ao governo de Borges de Medeiros.
Reconhece que a vila tem um traçado regular - pouco comum até às grandes cidades brasileiras - planejado pelo agrimensor José Angelino Goulart, que a governou entre 1904 e 1911: quarteirões com quadras de cem metros, ruas amplas, embora sem calçamento, calçadas estreitas, grandes e pequenas casas formando um aglomerado urbano que parte da Praça XV de Novembro em direção ao Norte e ao Sul. Praça? Ney ri quando observa o quadrilátero que tem à frente pela janela da Intendência: poucas árvores plantadas, bois e cavalos disputando o pasto – o que o faz vê-la mais como potreiro do que como logradouro público.
Intendente! Ney regozija-se com o cargo mais importante de sua ainda curta carreira, e assume contida satisfação pelo fato de administrar uma vila com tanto por fazer. A mente em efervescência começa a planejar as medidas que precisará tomar para marcar a sua administração, primeiro pacificando a política municipal, depois, organizando a vida comunitária com água, luz, calçamento, serviços sanitários. Incomoda-lhe o fato de que poucas residências sejam dotadas de privadas nos quartos de banho, o que obriga a municipalidade a dispor de um recolhimento semanal dos dejetos humanos.
Tão logo ascende, portanto, ao cargo – ainda que provisório conforme a nomeação assinada por Borges de Medeiros -, o novo intendente passa a emitir atos, um deles determinando a transferência do cemitério para um local mais distante das residências. E a projetar o futuro, para o que, contudo, precisa de uma definição governamental sobre o período certo de seu mandato: se um ano, como argumentam os seguidores de Barbosa, à espera das próximas eleições; ou de quatro, iniciando agora, como imaginam o próprio Ney e os membros da Comissão Municipal do PRR.
Homem jovem e de estatura próxima dos dois metros de altura, o novo intendente transmite autoridade, o que gera reações diferentes entre os que o observam: muitos se sentem atraídos por seu modo decidido de ser; mas alguns temem que tanto voluntarismo atropele lideranças estabelecidas anteriormente, fira suscetibilidades e agrave as disputas ainda contidas entre as facções.
SOBRE O AUTOR
Luiz Antônio Nikão Duarte (Porto Alegre, 1953) é formado pela PUCRS (graduação/1977, especialização, 1982 e doutorado/2012), ESPM (MBA/2002) e UFRGS (mestrado/2007).
Exerce o Jornalismo desde 1975, com passagens pelos grupos DiárioS e Emissoras Associados, Caldas Júnior, Jaime Câmara, RBS, O Estado de S. Paulo, Sistema Jornal do Brasil; pelos Governo Federal e do Rio Grande do Sul; e ainda pelo Congresso Nacional, pela Associação Nacional de Jornais, pela Federação das Indústrias (FIERGS) e pela PUCRS.
Professor (UnB e Uniceub, na década de 1990 e da Unisinos, na atualidade). Participou da antologia Contos de Oficina 21 (Porto Alegre: Edipuc, 1998) e escreveu os livros Redação em RP (São Leopoldo: Unisinos, 2012) e A guerra de Cacimbinhas (Porto Alegre: ComEfeito, 2015).
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Nikão, parabéns pelo livro e pelo esforço de juntar todas as informações para transforma-las em um texto maravilhoso.
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